segunda-feira, 26 de junho de 2017

OPINIÃO - ALÍPIO DE FREITAS, PRESENTE!












                                                                                        André de Paula

Tive a honra de, assessorado por Antônio Louro, ter conseguido a anistia política do ex-padre e guerrilheiro Alípio de Freitas, morto recentemente, em 13 de junho, em Lisboa aos oitenta e oito anos. Além disso, conseguimos sua reintegração à Universidade do Maranhão e o resgate de sua cidadania brasileira.

Alípio participou do Congresso Mundial da Paz em Moscou e conviveu com o poeta chileno Pablo Neruda e com a revolucionária espanhola La Pasionaria.

O jornal O Correio da Manhã apresenta-o como um dos fundadores das Ligas Camponesas ao lado de Francisco Julião.

Depois de morar no México e em Cuba, entrou no Brasil clandestinamente. Na esquerda armada organizou atentados que visavam a derrubada do Regime Militar e acabou preso por dez anos.

Alípio de Freitas teria sido o grande articulador do atentado a bomba do Aeroporto de Guararapes em Recife por meio do qual se pretendia matar o Ministro da Guerra, Costa e Silva, depois Presdente da República. Mas, o General não estava no aeroporto.

O jornalista Élio Gaspari relara que, neste atentado, morreram um Almirante e um jornalista, sendo que o guarda que encontrou a bomba teve a perna amputada e o Secretário de Segurança de Pernambuco perdeu quatro dedos da mão esquerda. Além disso, treze pessoas ficaram feridas.

Numa entrevista, ele disse: “Morreu gente, nós lamentamos. Mas era uma guerra, tinha que haver vítimas”.

Ao ser preso, sofreu torturas inimagináveis, nada tendo entregue. Liberado em 1979, mudou-se para Moçambique, em 1981. Mais tarde, na década de 1980, voltou para Portugal e integrou-se, como jornalista, à equipe de profissionais da RTP. Aposentou-se em 1994, aos 65 anos. Em seguida, em 2010, integrou-se ao Conselho Editorial do jornal “A Nova Democracia”.

No livro “Resistir É Preciso — Memória do Tempo da Morte Civil no Brasil” (Record, 279 páginas), Alípio de Freitas menciona o goiano Manuel Porfírio (torturadíssimo no DOI-Codi), filho de José Porfírio. Eles ficaram presos juntos. Na prisão, insistiram com o ex-padre se ele sabia do paradeiro de José Porfírio de Souza e de Aldo Arantes.

Trecho do livro: “A certa altura do interrogatório, quando eu mais rolava pelo chão do que ficava de pé, o capitão Correia Lima parou de dar-me choques elétricos e mandou que me levantasse, encostado a uma parede da sala. Disse que me retirassem um dos eletrodos de um dos pés; em seguida, ordenou-me que o ligasse no pênis. Recusei-me. O capitão Correia Lima gritou que eu tinha de ligá-lo. Calei-me, a expectativa do que iria acontecer. Então um soldado abaixou-se à minha frente e preparou-se para cumprir a ordem. Quando se aproximou, já com o eletrodo na mão, e se abaixava para ligá-lo, somei as poucas forças que tinha a todo o meu ódio e desferi-lhe um pontapé debaixo do queixo que o projetou de costas para o meio da sala. Um grito medonho partiu de todas aqueles gargantas enfurecidas: ‘Ao pau-de-arara, ao pau-de-arara com este filho da puta!”

Alípio de Freitas deixa uma filha, a cantora brasileira Luanda Cozetti.

Alípio de Freitas foi homenageado pelo cantor português Zeca Afonso com a música “Alípio de Freitas”, do disco “Com as minhas tamanquinhas”. Letra da música:

“Baía de Guanabara/Santa Cruz na fortaleza/Está preso Alípio de Freitas/Homem de grande firmeza/Em maio de mil setenta/Numa casa clandestina/Com companheira e a filha/Caiu nas garras da CIA”.

Talvez, se tivesse se ordenado padre após o Concílio Vaticano II ou mesmo no pontificado de Francisco, não tivesse largado a batina, uma vez que nutria amizades com vários expoentes da Teologia da Libertação.

Alípio foi coerente com sua opção pelos pobres e pelo socialismo até as últimas consequências, sendo, na verdade, um herói internacionalista.

André de Paula é advogado da Frente Internacionalista dos Sem-Teto (FIST) e membro da Anistia Internacional.

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