segunda-feira, 4 de fevereiro de 2019

OPINIÃO - O JUIZ, O GOVERNADOR E A ALDEIA MARACANÃ






*André de Paula



Na Audiência de Conciliação realizada dia 24/3/2013 que teve a presença da imprensa e deste advogado representando os interesses dos indígenas, o então juiz federal de plantão, Wilson José Witzel, afirmou que se fosse o juiz do processo ou autoridade estadual repassaria a Aldeia Maracanã para ser administrada pelos indígenas. Agora, como governador, diz que vai abrir o espaço para a construção de um shopping center. Em qual dos Witzels devemos acreditar? No juiz ou no governador?

O Brasil, diferente de outros países, não puniu os torturadores, apesar desse crime ser hediondo. Além disso, a Comissão Nacional da Verdade (CNV) errou ao omitir o genocídio praticado contra cerca de oito mil indígenas pela ditadura empresarial militar de 64.


O requinte de perversidade incluiu desde torturas a crianças até mortes por crucificação, uso de dinamite, envenenamento no açúcar doado misturado com estricnina e arsênico, disseminação de varíola e venda de crianças, muitas vezes, chegando mesmo à liquidação de tribos inteiras com o intuito de tomar as terras e praticar trabalho escravo, conforme heroico relatório do procurador Jader de Figueiredo Correa, falecido em suspeito acidente de ônibus após ter recebido inúmeras ameaças de morte. Ele percorreu cerca de dezesseis mil quilômetros quadrados visitando aldeias a pedido do então ministro do interior Afonso Augusto de Albuquerque, produzindo em 1967 sete mil páginas.

Este documento riquíssimo em detalhes passou anos engavetado no Museu do Índio, teve sua divulgação proibida pelos militares que tomaram apenas a providência de mudar o nome de SPI (Serviço de Proteção ao Índio) para FUNAI (Fundação Nacional do Índio). Portanto, o mais adequado seria chamar a CNV de CNMV (Comissão Nacional da Meia Verdade).

O presidente recentemente eleito, capitão Bolsonaro, adepto dos métodos empregados pelos portugueses quando da invasão de nosso país (saques, estupros, assassinatos, roubo de terras e etc) quer, na verdade, ao dizer que os indígenas são preguiçosos e tem muitas terras, expulsá-los para entregar as terras e os aquíferos às vorazes mineradoras.

Temos a obrigação de tentar reverter esta situação com a luta pela demarcação das terras pertencentes aos índios que são os verdadeiros donos do país e aqui no Rio defender a Aldeia Maracanã, antigo Museu do Índio, próximo ao estádio de mesmo nome, onde a tortura já campeou também no período ditatorial. Este espaço foi heroicamente retomado pelos indígenas após o criminoso, violento e ilegal desalojamento feito pela quadrilha de Cabral e Pezão que então governava o Estado

Esperamos que o governador reflita e encarne a posição da audiência de conciliação, pois assim, estará fazendo justiça aos povos originários tão massacrados que foram por nós brancos.


André de Paula é advogado da Frente Internacionalista dos Sem-Teto (Fist) e membro da Anistia Internacional.


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